03/06/2015

O QUE GRAMADOS BONITOS E O ESTUDO TÊM EM COMUM.

por Dr. Noa Kageyama, publicado originalmente no blog do site The Bulletproof Musician
WHAT BEAUTIFUL LAWNS AND PRACTICING HAVE IN COMMON



Me disseram que há duas estratégias básicas para cultivar um gramado livre de plantas daninhas. O método óbvio é pegar uma garrafa de herbicida e matar todas as ervas daninhas que encontrar no caminho. Claro, o que sobra no fim é um monte de pontos marrons mortos com pequenas manchas de grama triste preenchendo as lacunas.

O outro método envolve trabalhar para encorajar a grama a crescer mais saudável, forte e espessa, no fim ela vai se sobrepor às ervas daninhas e deixar menos espaço para que cresçam. Ainda tenho que ver a evidência da eficácia desta estratégia no meu próprio quintal, mas me acompanhem enquanto eu permaneço nesta metáfora por um momento.

SOMOS HERBICIDAS TREINADOS


Somos condicionados a nos preocupar com erros, notas erradas, desafinações, sons ruins - todas as coisas que estão "erradas" em nossas performances. Gastamos relativamente pouco tempo para ouvir e reforçar as coisas "certas". Se as coisas parecem boas, elas são praticamente deixadas de lado e, muitas vezes, mal são reconhecidas em sessões de estudo, aulas, ensaios, etc.

Somos todos herbicidas. E o quanto melhor tocamos, pior isso geralmente se torna.

Conforme nos tornamos cada vez mais qualificados, tendemos a adotar uma visão "tudo-ou-nada" do nosso desempenho. Em outras palavras, nós acertamos ou erramos a nota. Se acertamos, estamos satisfeitos e passamos para a próxima coisa. Se erramos, nós voltamos e tentamos novamente, e novamente, e novamente, até acertar. Enquanto isso, tornamo-nos cada vez mais frustrados quando não acertamos sempre.

Mas é verdade que você ou acerta ou erra a nota, certo?

NÃO NEGLIGENCIE O QUE VOCÊ FEZ DIREITO

Na verdade, não. Se a nota sai ou não exatamente do jeito que você quer, isso é apenas parte da equação. Provavelmente houveram vários elementos na tentativa de execução da nota que você acertou. Por exemplo (e eu uso um exemplo do violino, já que é o que eu conheço melhor), na tentativa de fazer uma mudança de posição para uma nota aguda complicada talvez você tenha soltado a pressão dos dedos, soltou o polegar, preparou a fôrma da mão, e até mesmo levantou a voluta do violino para ajudar na trajetória da mão, mas no final errou porque não trouxe seu cotovelo pra dentro o suficiente. Sim, você errou a nota, mas muitos outros elementos importantes estavam no lugar.

Mestria e desenvolvimento de competências é um processo. Há uma série de passos e fases pelos quais se deve passar no aprendizado de qualquer habilidade. Assim, mesmo que o produto final não seja o que você queria, alguns dos elementos foram executados com êxito.


O que isso importa? Eu ainda errei a nota.

A LIGAÇÃO ENTRE O FOCO, MOTIVAÇÃO E CONFIANÇA

Em última análise, a nossa forma de estudar tem um impacto mais significativo na nossa confiança no palco e sucesso do que imaginamos - e, muitas vezes, de formas que ainda nem começamos a considerar. Concentrar-se exclusivamente nas partes da equação total que você errou, e continuando a ignorar as partes “prontas" da equação não só leva à frustração, mas diminui a motivação, confiança, e mais importante, mesmo a consistência da sua capacidade de executar a atividade em si.

Mesmo?

Sim, mesmo. Aqui está o porquê.

Confiança

Quando tudo que você ouve e pensa é em tudo o que você está fazendo errado ou mal (mesmo que você esteja fazendo quase tudo corretamente), a sua percepção geral de sucesso e habilidade (ou média de rebatidas se você preferir), torna-se extremamente distorcida, o que põe a sua confiança em queda livre.


Frustração

Quando a maioria do seu foco é apenas no resultado, você falha em obter um panorama geral do que está acontecendo. Assim sendo, você não está plenamente consciente ou alerta sobre as razões técnicas subjacentes pelas quais acerta ou erra a nota. Portanto, sua taxa de sucesso permanece imprevisível e é mais do que provável que esteja apenas reforçando hábitos ruins ou indesejáveis. Não só isto vai dar a impressão de não estar progredindo (porque não está), mas é também como a gente pega e "aprende" os maus hábitos que depois aparecem em situações críticas de performance.


Motivação

Quão motivador é estudar quando você sente que não está fazendo nenhum progresso?

Consistência

Uma das chaves para um maior controle técnico (tanto na sala de estudo quanto no palco) é a consciência. Se os elementos de sucesso da habilidade permanecem fora da sua consciência e você realmente não sabe 1) o que você está fazendo certo, e 2) o que se sente (cinestesicamente, não emocionalmente) quando executa esses detalhes corretamente, é provável que você não saiba como lidar consigo mesmo no palco quando for pra valer.


Ao ignorar os detalhes, você não está conscientemente ou deliberadamente reforçando os aspectos da habilidade que são corretos e precisam ser cimentados no lugar para uma execução bem-sucedida. Na verdade, é provável que muitos dos elementos corretos da habilidade estejam acontecendo por acaso.Já ouviu falar de sorte de principiante? Quando tentamos algo completamente novo, não é incomum ir ok nas primeiras vezes. No entanto, não passa muito tempo até nos encontramos lutando para recriar o nosso sucesso inicial, porque nessa fase no processo de aprendizagem, nós realmente não sabemos o que fizemos que levou ao sucesso inicial.

Isto é o que acontece com crianças prodígio ou instrumentistas "naturais". Eles crescem tocando muito bem com base em seus instintos e tendências naturais. Mas, eles finalmente chegam a um teto, momento em que (assumindo que eles querem atingir seu potencial) precisam aprender, talvez pela primeira vez em suas vidas, como controlar deliberadamente as coisas que costumavam fazer sem pensar.

Para total confiança e consistência, você precisa saber que sabe o que está fazendo. Sim, isso é um pouco confuso... leia de novo lentamente se você não pegou da primeira vez. Já teve a sensação, ao fechar a porta de casa, de que pode ter deixado o fogão ligado? Em toda a probabilidade você desligou, mas o fez em piloto automático, por isso não ficou muito bem gravado na memória. Como resultado, seu nível de confiança sobre se você o deixou ligado ou desligado não é muito alto. Da mesma forma, se você passar por sessões de estudo no piloto automático, tem uma parte de você que sabe que você não sabe realmente o que está fazendo, o que leva a dúvidas, inseguranças e outras coisas no palco... coisas desagradáveis.

Quando você tiver estudado conscientemente, com um alto grau de consciência em relação ao que você está fazendo, e o que se sente cinestesicamente ao fazer as coisas corretamente, você está aumentando a sua capacidade de fazer melhores ajustes finos no palco.

Concentração

Último de todos, estudar com este grau de consciência deliberada não só aumenta a motivação e consistência, mas aumenta a sua capacidade de se focar e concentrar por períodos maiores e maiores de tempo. Não deixe que a curta duração do presente parágrafo leve você a pensar que este é um benefício menor. Apenas saiba que é significativo.

PARE DE JOGAR O BEBÊ FORA JUNTO COM A ÁGUA DO BANHO

Assim como um punhadinho de dentes-de-leão não deixa o seu gramado inútil e que deve ser completamente arrancado, uma nota que falha, ou uma passagem soando ruim não significa que tudo que você fez deve ser jogado fora. Salve o que pode, cultive, reforce, construa sobre ele, e em breve você vai encontrar-se sobrepondo todas as "ervas daninhas" ou elementos indesejados no seu tocar e nas suas performances, com um aumento na motivação e confiança para ajudar!

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Dr. Noa Kageyama é um violinista que resolveu partir para a área da Psicologia da Performance e hoje integra o corpo docente da Juilliard School e New World Symphony em Miami, além de ser convidado das principais instituições de ensino de música nos EUA, ensinando músicos como tocar o seu melhor sob pressão através de aulas ao vivo, treinos e um curso on-line.

Tradução autorizada, por Helena Piccazio.

crédito da foto: heipei via photopin cc

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